Há algum tempo, Freitas do Amaral escreveu:
"Não me revejo em nenhum dos partidos políticos existentes em Portugal. O PSD e o CDS estão demasiado à direita. O PCP e o BE estão demasiado à esquerda e o PS tem excessiva sensibilidade para tratar dos grandes problemas económicos e muito pouca sensibilidade para tratar dos mais pobres e desfavorecidos em Portugal. Como cidadão, apesar de não ser a minha família política, vejo isto com muita apreensão, porque se os partidos de direita, por definição, favorecem o sistema capitalista e se o principal partido de esquerda faz o mesmo, ou ainda mais, onde está a esquerda democrática no nosso País? Deixou de estar e isso é mau para o equilíbrio da política portuguesa. Se a alternância que existe é entre o PSD e o PS , que ambos competem para saber qual consegue governar mais à direita, pergunto com que partidos é que as pessoas menos favorecidas podem identificar-se. Estamos a atirá-las para as mãos do PCP e do BE, que são partidos revolucionários. Ainda vamos aí?"
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Para melhor poder expor aquilo que entendo, vou definir duas conjecturas e um corolário:
«Conjectura do PS»: se a esquerda à esquerda do PS apresenta uma proposta formal de entendimento, com um programa bem definido, então o PS recusa.
«Conjectura da Esquerda»: se a esquerda à esquerda do PS apresenta uma proposta formal de entendimento, com um programa bem definido, o PS aceita e então cada uma das esquerdas, e portanto o seu conjunto, aumentará de votação (porque muitos dos que actualmente se abstêm identificar-se-iam com essa solução).
«Corolário»: se a esquerda à esquerda do PS apresenta uma proposta formal de entendimento, com um programa bem definido e o PS recusa, então a esquerda à esquerda do PS ficará com a maioria dos votos daqueles que situando-se à esquerda da esquerda do PS se abstêm.
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Penso que a análise de Fretas do Amaral é bastante boa. Seria interessante entender porque é que o PS está nessa situação. Pessoalmente penso que perdeu o rumo. Tem um discurso de uma esquerda em sentido lato, mas a sua prática é de direita. É esquizofrénica. Vive num permanente relativismo político: algures entre o que a esquerda e a direita do momento se apresentarem. Mas isso é o que o PS (os ou diferentes PSs) vão fazendo e pensando.
Como se depreende do discurso de Freitas, há um vazio político à esquerda. Não podia estar mais correcto. Ninguém o ocupa. O PS abandonou-o e nem o BE nem o PCP o tomam como seu. Não sei se será por pureza ideológica. Apesar de haverem variações quanto à tonalidade, o PCP tem um espaço político mais ou menos bem definido no espectro. O BE, penso não ser a mesma coisa: nasceu como uma federação de partidos à esquerda, cada um com a sua ideologia mais ou menos bem definida, que se assumiu como solução de convergência.
Num tal quadro, deveria de haver inteligência política à esquerda do PS para o puxar para o seu lado. Como já alguém disse, não é bom depender das acções dos outros. Assim, deveríamos (neste caso, considero o nós como aqueles que estão à esquerda da esquerda do PS) declarar que, tendo uma opinião bem diferente daquela que o PS tem sobre a forma desastrosa com que tem dirigido o país, estaria disponível para chegar a um entendimento, com um programa bem definido, tendo em vista mudar o rumo que o país leva. Esta seria uma forma de ocupar o tal espaço político, que permitiria traduzir-se em votos (temos aqui a «Conjectura da Esquerda»). Além disso, apresentada a proposta, obrigaria o PS a definir-se. Neste momento, a esquerda assume que apresentada uma proposta formal, o PS recusaria (temos aqui a «Conjectura do PS»). Mas nenhuma destas conjecturas está demonstrada porque nunca aconteceu. E nunca aconteceu por a esquerda à esquerda do PS nunca ter verificado na pratica aquilo que assume (neste caso, a «Conjectura do PS»). Falta talvez um pouco de método cientifico. É que na actualidade, a esquerda à esquerda do PS, por assumir algo que nunca foi verificado, poderá estar a ser penalizada por isso (é essa a minha convicção) nas urnas: todos aqueles eleitores do espaço por ocupar sentir-se-ão órfãos e não votam.
Não se trata de diabolizar ninguém: nem este PS do Sócrates (porque é o que temos), nem a esquerda à esquerda deste, porque também é a que temos.
Mas, como é óbvio, e como qualquer conjectura, ambas as conjecturas enunciadas carecem de demonstração. Convém não esquecer que há gente concreta que sofre e sofrerá ainda mais devido a estes pressupostos.
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